Ela se encostou ao balcão e preferiu chorar. A
bebida não mais mascarava suas mágoas. Escondidas por trás de uma bela
maquiagem por hora borrada. Do outro lado, as mãos molhadas dos copos sujos de
uma madrugada inteira. Era só ouvidos e assim acostumou-se há tempos. Não
consta diploma, apenas experiência e bagagem. Uma simples pergunta e abre-se a
brecha para o início de um diálogo:
- O que deseja tomar? Pergunta o sóbrio
garçom.
- Eu matei um amor. Emenda a bela sem o menor
pudor.
- Com toda certeza, frieza e cálculo desse mundo.
Matei sem chance de respiro ou reação. Fiz por achar certo, mas sofro, sofro todos os
segundos da minha vida.
Com o olhar fixo no último copo sujo com
resquícios de vodca e maracujá o mesmo sentencia sua opinião.
- Não houve assassinato querida. Houve sim um
parto natural para um renascimento. Pense assim. Você jamais será uma criminosa
e sim uma libertária, uma fonte de vida. Completou o sábio lavador de louças.
Como uma estátua embasbacada a mesma tomou o
resto d´água e levantou-se. Ligeiramente babada e completamente descabelada
permitiu que sua última lágrima descesse e caminhasse até o fim do seu rosto. Foi o
símbolo da aceitação imediata misturada ao medo da verdadeira perda.
Recuando de costas em direção a saída parou pela última vez olhando fixamente ao seu confissionário. A sensação de
alívio dominava um ambiente antes tomado por toneladas de peso. A réu estava
livre de todas suas acusações enquanto a vítima passava a gozar dos bens da
ressurreição em liberdade plena.
Ainda do outro lado do balcão o sábio servidor
viu sua cliente deixar o local com suavidade e certa mudança. Com total
indiferença de quem pouco se preocupa com o resultado pensou: "As nossas
ações podem ser mascaradas e o que por um tempo foi dor torna-se felicidade.
Jamais existirá escuridão sem luz, morte sem vida".
Ao desviar seu olhar da pia quase limpa para o
balcão de pedidos se deparou com uma nova angústia sentada à sua frente.
- O que deseja tomar? Perguntou.
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